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Pesquisa brasileira revela como alguns cânceres de mama escapam do tratamento

Resumo
• A pesquisa brasileira identificou 90 variações da proteína HER2, explicando por que alguns tumores de mama resistem aos tratamentos mais modernos.
• As isoformas alternativas podem impedir que anticorpos reconheçam a HER2, o que ajuda a entender falhas terapêuticas em pacientes HER2-positivas.
• O estudo mostrou que o splicing alternativo é o responsável por gerar diferentes versões da proteína, influenciando diretamente a resposta aos remédios.
• Análises com células tumorais confirmaram que linhagens com isoformas incomuns realmente não respondem aos medicamentos direcionados à HER2.
• As descobertas abrem caminho para tratamentos mais personalizados e futuros exames que identifiquem quais versões da HER2 estão presentes em cada tumor.
Nem sempre o câncer de mama responde ao tratamento do jeito que médicos e pacientes esperam. Mesmo com terapias modernas e medicamentos de alto custo, algumas mulheres enfrentam tumores que resistem, recidivam ou simplesmente não reagem como o previsto. Foi justamente tentando entender esse “drible” da doença que um grupo de pesquisadores brasileiros deu um passo importante: eles descobriram que a proteína HER2, alvo de muitos remédios usados hoje, é muito mais diversa do que se imaginava.
O resultado, publicado na revista científica Genome Research, não é uma promessa de cura imediata, mas ajuda a explicar por que, em alguns casos, a mesma terapia funciona em uma paciente e falha em outra. E, ao mesmo tempo, abre uma janela para tratamentos mais personalizados no futuro.
HER2: a proteína que pode tornar o tumor mais agressivo
A HER2 é uma proteína presente na membrana das células, envolvida no controle do crescimento celular quando está em níveis normais. O problema começa quando esse mecanismo “trava” na posição ligada: em certos tipos de câncer de mama, a produção de HER2 fica permanentemente ativada. Quando isso acontece, a proteína passa a estimular um crescimento descontrolado das células, o que deixa o tumor mais agressivo, com maior tendência a se espalhar para outros órgãos. No Brasil, os tumores associados à hiperexpressão de HER2 correspondem a cerca de 20% dos casos de câncer de mama, um número significativo dentro do universo da doença.
Esses tumores, conhecidos como HER2-positivos, costumam ser tratados com uma combinação de quimioterapia e medicamentos que têm justamente a HER2 como alvo, bloqueando seus sinais de crescimento. São terapias sofisticadas, com custo médio por paciente em torno de dezenas de milhares de reais, e que podem trazer efeitos colaterais importantes, como náuseas, diarreia e queda dos glóbulos brancos.
De 13 para 90: a multiplicidade oculta da HER2
Até pouco tempo, eram conhecidas 13 variações (isoformas) da proteína HER2 nesses tumores. O novo estudo, conduzido pelo Grupo de Bioinformática do Hospital Sírio-Libanês com apoio da FAPESP, elevou esse número para 90. Na prática, isso significa que o que chamávamos de “HER2” não é uma única estrutura, mas uma família de versões levemente diferentes entre si, com combinações variadas de domínios proteicos e até posições distintas dentro da célula. Em algumas dessas variantes, os pesquisadores observaram algo especialmente relevante: a perda da região que permitiria a ancoragem clássica na membrana celular ou mesmo da área em que o anticorpo terapêutico se ligaria.
Pedro Galante, coordenador do grupo e autor correspondente do artigo, usa uma analogia simples para explicar a importância disso: o anticorpo funciona como uma chave que precisa encaixar em uma fechadura específica. Se a estrutura da proteína muda e aquela “fechadura” não está mais ali, a chave deixa de funcionar. Em outras palavras, o medicamento pode perder o alvo, o que ajuda a entender a resistência de alguns tumores às terapias direcionadas à HER2.
O papel do splicing alternativo por trás dessas variações
Essa multiplicidade de versões não surge do nada. Ela está ligada a um processo chamado splicing alternativo, uma etapa essencial da expressão gênica que acontece depois que o DNA é transcrito em RNA. Nesse processo, o RNA pode sofrer “edições” finas: alguns trechos são mantidos, outros são descartados, gerando diferentes combinações a partir do mesmo gene. O resultado são proteínas parecidas, mas com pequenas alterações de estrutura e função.
Alterações no padrão de splicing já são conhecidas como fatores envolvidos em doenças genéticas e em vários tipos de tumores. No estudo, a equipe conseguiu mostrar que, no caso da HER2, essas mudanças não são apenas um detalhe técnico: elas têm impacto direto na forma como o tumor responde aos remédios.
Gabriela Der Agopian Guardia, pesquisadora do Sírio-Libanês e primeira autora do artigo, destaca que o splicing alternativo ainda não recebe tanta atenção na prática clínica quanto outros mecanismos, apesar de influenciar múltiplas frentes da doença. Segundo ela, enxergar de perto esse processo abre caminhos para imaginar drogas mais específicas e até novas abordagens de diagnóstico, capazes de enxergar não só se a paciente é HER2-positiva, mas quais versões dessa proteína estão realmente em jogo.
Do laboratório às células tumorais: testando a resposta aos remédios
Para chegar a essas conclusões, os cientistas analisaram 561 amostras primárias de câncer de mama presentes no The Cancer Genome Atlas (TCGA), um grande banco público de dados genômicos de tumores. A partir dessas informações, mapearam com mais precisão as diversas isoformas de HER2.
Mas o estudo não ficou apenas nos dados de arquivo. A equipe também trabalhou com linhagens celulares de câncer de mama cultivadas em laboratório, algumas sensíveis e outras resistentes a medicamentos como o trastuzumabe e os chamados conjugados anticorpo-fármaco (ADCs), uma classe de drogas que leva quimioterápicos potentes diretamente às células tumorais.
Ao observar que certas linhagens expressavam conjuntos alternativos de proteínas HER2, os pesquisadores previram que elas não responderiam bem aos tratamentos cujo alvo era a forma “convencional” da proteína. E foi exatamente isso que se confirmou: enquanto células com a versão padrão tiveram boa resposta, aquelas com isoformas alternativas mostraram resistência. Esse achado reforça a ideia de que, em vez de uma única HER2, existem várias “faces” da proteína, e que algumas delas, moldadas pelo splicing alternativo, não se encaixam bem nas terapias disponíveis hoje.
HER2-positivo, HER2-low, HER2-zero: um cenário mais complexo do que parece
Na prática clínica, os tumores de mama são classificados de acordo com o nível de expressão da HER2. Há aqueles claramente HER2-positivos, com forte sinal da proteína, candidatos clássicos às terapias-alvo. Em outros, ela aparece em níveis mais baixos (os chamados HER2-low) ou praticamente ausentes (HER2-zero), o que os coloca no grupo de tumores HER2-negativos. Nos últimos anos, no entanto, alguns tratamentos mais recentes – especialmente os anticorpos conjugados a drogas – vêm mostrando benefício também em parte dos casos HER2-low, o que já indicava que essa fronteira não era tão rígida.
Com as 90 isoformas mapeadas, o cenário se torna ainda mais rico e desafiador. Mais do que olhar apenas para a intensidade do sinal de HER2, a pesquisa sugere que será importante entender quais versões específicas estão presentes no tumor de cada paciente. Isso pode ajudar a explicar, por exemplo, por que duas mulheres com diagnóstico HER2-positivo, recebendo o mesmo esquema terapêutico, têm respostas tão diferentes.
O que essa descoberta significa para as mulheres hoje
É importante dizer com clareza: o estudo não muda, por enquanto, a indicação de tratamento que o oncologista faz no consultório. As terapias anti-HER2 continuam sendo fundamentais para muitos casos de câncer de mama e salvam vidas diariamente. O que a pesquisa traz é um olhar mais refinado sobre os bastidores da doença e uma possível explicação para situações em que o tratamento não funciona como esperado.
Em vez de atribuir a falta de resposta apenas à “agressividade do tumor”, os cientistas começam a enxergar, com mais nitidez, que parte da resistência pode vir dessas versões alternativas da proteína, que não são reconhecidas com a mesma eficácia pelos remédios atuais. Para as pacientes, isso abre uma perspectiva de futuro: à medida que a ciência avança, torna-se mais plausível imaginar exames capazes de identificar o padrão de isoformas de HER2 presente em cada tumor e, a partir daí, tratamentos ainda mais personalizados, evitando terapias caras e tóxicas quando há sinais de que a chance de resposta é pequena.
Câncer de mama no Brasil: números que reforçam a importância da pesquisa
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), o câncer de mama continua sendo um dos tipos mais incidentes entre as mulheres brasileiras (excluindo o de pele não melanoma) e a principal causa de morte por tumor na população feminina. A estimativa para este ano é de 73 mil novos casos, com maior concentração na região Sudeste, como aponta a publicação “Controle do câncer de mama no Brasil: dados e números 2025”, lançada durante o Outubro Rosa.
Em um cenário com tantos diagnósticos anuais, entender por que alguns tumores respondem bem e outros não às terapias é mais do que uma curiosidade científica: é uma necessidade urgente de saúde pública. Pesquisas como essa, desenvolvidas em centros nacionais como o Hospital Sírio-Libanês com apoio da FAPESP, ajudam a trazer o tema para perto da realidade brasileira e mostram que a produção de conhecimento científico no país tem impacto direto na vida das pacientes.
Próximos passos: além da mama, outros cânceres no radar
O trabalho com a HER2 no câncer de mama é apenas o começo. Entre os planos do grupo de pesquisa está ampliar as análises para outros tipos de tumores, como o de pulmão, em que a proteína também pode estar envolvida e onde já existem medicamentos semelhantes sendo utilizados. Os cientistas pretendem investigar se o padrão de expressão das isoformas de HER2 influencia a resposta a tratamentos em pacientes que já receberam terapias anti-HER2, especialmente os anticorpos conjugados a drogas. A validação clínica dessas hipóteses é o próximo passo para aproximar a descoberta do cotidiano dos consultórios.
Enquanto isso, para quem acompanha o tema como paciente, familiar ou leitora de uma revista feminina interessada em saúde, a mensagem principal é de informação e esperança realista: a ciência está avançando, o entendimento sobre o câncer de mama se torna mais profundo e, pouco a pouco, isso contribui para que cada mulher possa receber um cuidado mais individualizado. E, diante de um diagnóstico tão delicado, informação de qualidade é um dos aliados mais importantes ao lado do acompanhamento médico especializado.

Social Midia e crítica de cultura pop, Renata domina o mundo das fofocas e novelas como ninguém. Com uma trajetória em grandes portais de entretenimento, ela traz uma visão divertida e crítica sobre os bastidores do universo das celebridades e das tramas de novelas. Renata é conhecida pelo seu tom bem-humorado e envolvente, que leva os leitores a se sentirem parte dos acontecimentos, discutindo os detalhes de suas novelas favoritas e compartilhando curiosidades imperdíveis das estrelas.



